tomo a palavra: escrever. não sou eu quem possuo a palavra, é ela quem me possui. quantas vezes acontece, quantas?, de escrever e não perceber o que é que estou dizendo, escrever como um ato por si acontecido, só realizo quando escrito;
ou colocar um termo, uma estrutura, num contexto que rebela os limites, ou usar uma palavra que não sei bem o que significa e então: se penso que não funciona, que estou definitivamente errada, vou ao dicionário e percebo que cabe, que aquela palavra estava ali pra ser usada ali, tudo encaixado no reino dos significados.
digo: não me parece que a constatação milimétrica do controle sobre a palavra governe um texto, nos leve a ele acabado. há trabalho, é claro, lógico e racional. mas, se há dança, no escuro se dança. e, sobretudo, se dança melhor quanto mais se dança.
não é uma letargia ou inércia com a língua que vai dá-la em conhecimento pra mim, pra você. é antes um trabalho constante, ou melhor, um exercício de atenção, a tudo que parece que não importa, mas que se notar, vais perceber como é fundamental. a inteligência é um uso, um aprendizado, é possível educar o olhar, a escrita, a visão:
leio lévi-strauss, de "pensamento 'primitivo' e mente 'civilizada' " no mito e significado
vejam só que coisa:
"Quando estava a escrever a primeira versão de Mithologiques, deparou-me um problema que, na aparência, era extremamente misterioso. Parece que havia determinada tribo que conseguia ver o planeta Vénus à luz do dia, coisa que para mim era impossível e inacreditável. Pus o problema a astrónomos profissionais; eles disseram-me que efectivamente nós não o conseguimos, mas que, atendendo à quantidade de luz emitida pelo planeta Vénus durante o dia, não é realmente inconcebível que algumas pessoas o possam detectar. Mais tarde consultei velhos tratados sobre navegação pertencentes à nossa própria civilização, e tudo indica que os marinheiros desse tempo eram perfeitamente capazes de ver o planeta à luz do dia. Provavelmente, também nós seríamos capazes de o ver se tivéssemos a vista treinada."
treinar, ensaiar, é para efetuar algo ao ponto de se tornar habitual. pensar leva a pensar. interessar-se pelas exceções nas regras, e, ao encontrá-las, explicá-las, em sentido largo. porque se coube na sintaxe, cabe na sintaxe., cria-se a sintaxe. todos os meios e as ultrapassagens cotidianas escrevem a língua em mim. treino, invento, conheço a linguagem no esquecimento dela, mais ainda porque é a língua que me pensa, não o contrário.
ou colocar um termo, uma estrutura, num contexto que rebela os limites, ou usar uma palavra que não sei bem o que significa e então: se penso que não funciona, que estou definitivamente errada, vou ao dicionário e percebo que cabe, que aquela palavra estava ali pra ser usada ali, tudo encaixado no reino dos significados.
digo: não me parece que a constatação milimétrica do controle sobre a palavra governe um texto, nos leve a ele acabado. há trabalho, é claro, lógico e racional. mas, se há dança, no escuro se dança. e, sobretudo, se dança melhor quanto mais se dança.
não é uma letargia ou inércia com a língua que vai dá-la em conhecimento pra mim, pra você. é antes um trabalho constante, ou melhor, um exercício de atenção, a tudo que parece que não importa, mas que se notar, vais perceber como é fundamental. a inteligência é um uso, um aprendizado, é possível educar o olhar, a escrita, a visão:
leio lévi-strauss, de "pensamento 'primitivo' e mente 'civilizada' " no mito e significado
vejam só que coisa:
"Quando estava a escrever a primeira versão de Mithologiques, deparou-me um problema que, na aparência, era extremamente misterioso. Parece que havia determinada tribo que conseguia ver o planeta Vénus à luz do dia, coisa que para mim era impossível e inacreditável. Pus o problema a astrónomos profissionais; eles disseram-me que efectivamente nós não o conseguimos, mas que, atendendo à quantidade de luz emitida pelo planeta Vénus durante o dia, não é realmente inconcebível que algumas pessoas o possam detectar. Mais tarde consultei velhos tratados sobre navegação pertencentes à nossa própria civilização, e tudo indica que os marinheiros desse tempo eram perfeitamente capazes de ver o planeta à luz do dia. Provavelmente, também nós seríamos capazes de o ver se tivéssemos a vista treinada."
treinar, ensaiar, é para efetuar algo ao ponto de se tornar habitual. pensar leva a pensar. interessar-se pelas exceções nas regras, e, ao encontrá-las, explicá-las, em sentido largo. porque se coube na sintaxe, cabe na sintaxe., cria-se a sintaxe. todos os meios e as ultrapassagens cotidianas escrevem a língua em mim. treino, invento, conheço a linguagem no esquecimento dela, mais ainda porque é a língua que me pensa, não o contrário.
Nenhum comentário:
Postar um comentário